domingo, 1 de julho de 2012

Uma História do Outro Mundo


I

Uma rapariga chega à Rua da Paz de mala na mão e senta-se numa cadeira do Café Central. Ao ser atendida, pede um copo de água. O empregado faz uma cara de poucos amigos mas regressa com um copo de água, poisando-o na mesa com brusquidão. A rapariga pega no jornal local, que está em cima da mesa e procura um trabalho na secção de anúncios. Então, faz um círculo num dos anúncios, com a esferográfica e, pegando nessa página, rasga-a e leva-a, levantando-se. Chega a uma loja de ferragens e fala com o patrão. Sai da loja satisfeita e dirige-se para o café novamente. Lá, fala com a dona do café, que é gorda e tem mau aspeto. Sai com alguma pressa e dirige-se a uma casa velha e esguia, com dois andares e um sótão.
Bate à porta com a maçaneta, primeiro levemente e depois com mais força. Uma velha debruça-se da janela do segundo andar e pergunta o que quer. Ela responde que procura um quarto. “Será que a senhora tem um quarto para alugar? Não posso pagar muito pois acabei de chegar e só amanhã começo a trabalhar!”
A velha desaparece da janela, fecha-a e demora alguns minutos a aparecer à porta.
Ao abrir a porta, mostra uma cara antipática, é magra, tem uma verruga no queixo e o cabelo em desalinho preso no alto da cabeça. Usa avental desbotado e umas pantufas muito velhas. Deixa entrar a rapariga e, por trás dela, faz um sorriso misterioso. A rapariga entra para uma sala com um velho sofá cheio de buracos, rasgado, coberto com mantas velhas, um xaile e um gato preto que a dona sacode, abanando a mão ossuda e comprida. Ordena à rapariga que se sente e ela obedece. Falam durante algum tempo e a rapariga acaba por ser conduzida a um quarto. A velha abre a porta do quarto, fazendo um sinal à rapariga para entrar. Com a cabeça indica-lhe a cama. A rapariga olha para a cama, que tem apenas um colchão de palha, às riscas azuis e brancas, muito velho. Olhando rapidamente à volta verifica que só tem um banco como mesinha de cabeceira e uma cadeira onde poderá pendurar alguma roupa. Nem tapete, nem guarda fato.

A velha faz novamente aquele sorriso misterioso e fechando a porta, afasta-se pelo corredor esfregando as mãos de contente, enquanto faz novamente aquele sorriso…

A rapariga limpa o pó da cadeira e senta-se, desolada, apoiando os cotovelos nos joelhos e a cabeça entre as mãos… Começa a chorar.

Enxuga as lágrimas e, olhando para o teto, verifica que não tem lâmpada. Mais ao lado, uma pequena janela deixa passar um fio de luz que incide numa das tábuas do sobrado. Seguindo o fio de luz com o olhar a rapariga verifica que há uma argola de ferro nessa tábua e aproxima-se, curiosa, debruçando-se sobre o chão.

( Continua)

2 comentários:

Joalex Henry disse...

Finalmente regressaram as histórias do Beco da Rua da Paz! Estou com curiosidade de saber o final desta.
Parabéns pelo regresso!
José Alexandre

Marialobo disse...

Isto é mais um roteiro para uma história do que uma história! Para isso teria de ser aperfeiçoda! Obrigada pelo incentivo!Também gostei de ler sobre os azulejos e outras coisas!